domingo, 28 de abril de 2013

Overdose Musical

Quando eu era apenas um mini-lobisomem juvenil e minha mãe ainda me buscava na escola para me levar para casa, tinha uma atitude dela que me irritava bastante. Aquele maldito hábito de colocar para repetir a mesma música várias vezes. Acho que muitas pessoas tem esse hábito (e com toda razão), mas aquela mania de ouvir uma mesma música insistentemente dentro do carro sem ar-condicionado ao meio-dia em um engarrafamento em Goiânia - quem vive aqui sabe que é como ser uma empadinha dentro do forno - era uma grande tortura para um filho que, claro, precisa implicar com o gosto musical e as manias dos pais.

Acontece que hoje em dia muitas coisas que minha mãe escutava eu ainda escuto por vontade própria. Até aí tudo bem. Mas o problema é que ando me pegando com a mania de colocar a música para rodar no Youtube e repetindo algumas dezenas de vezes. É claro que estou me sentindo mal por isso, o cara mais chato do mundo, com mania de adultos bregas. O que me consola é que estou fazendo isso de forma gratuita, já que só preciso procurar na internet, enquanto minha mãe, quando eu era criança e ainda não estávamos na era das entradas USB dentro dos carros, fazia questão de comprar o CD na Bazar Paulistinha para ouvir aquela única faixa incansavelmente.

Eu ainda to naquele deslumbramento em que sou um adulto apesar de jovem. Como moro sozinho há um tempo e não vejo com frequência meus pais, é difícil perceber alguma atitude minha que é reflexo deles. Me pegar fazendo isso é um fato que me faz refletir essas mudanças que passamos quando nos tornamos adultos. Todo jovem quer ser diferente, dar orgulho aos pais e, ao mesmo tempo, ser o oposto deles nos aspectos que achamos negativos. Por mais que nos enganemos e escondamos nossos podres, é obvio que os nossos pais sabem nos decifrar muito mais do que nós sabemos em relação a eles. Tenho certeza que minha mãe quando ler isso aqui vai dar uma grande risada da minha cara por eu ter assumido a minha derrota e ter adquirido essa mania estúpida e que faz todo sentido na vida de qualquer amante de música.

Lembro-me na época do Orkut em que eu e uma amiga fizemos a comunidade "Overdoses Musicais". Na época, para mim, a overdose se dava por uma banda ou até mesmo música que nós poderíamos ter dentro da gente e não necessariamente precisávamos colocar replay. Talvez eu tenha me tornado de vez um adulto brega assim como acho que são os meus doadores de material genético. Hoje to livre desse paradigma de repetição da música. Assumo que faço isso um pouco envergonhado e com um orgulho reprimido, até porque uma música pode ser a forma mais saudável de termos uma overdose, sairmos um pouco do nosso plano habitual para nos elevarmos em outro patamar áureo, bem prático e gostoso, de nos sentirmos pelo menos por alguns instantes como anjos planando em céus nunca explorados.