quinta-feira, 15 de março de 2018

Ela morreu no dia do Pi

Ontem foi o dia do Pi (π). Sim, aquele símbolo da matemática. Aquele número infinito que começa com 3,14 e depois segue até não sei onde. Aquele que é chato pra caraca. Aquele que se repete em qualquer circunferência. E também se repete na natureza em, por exemplo, ondas e na Via Láctea.


Para quem não se lembra - eu também não me lembrava até a Superinteressante me refrescar a mente no Twitter - para chegar ao número do Pi, basta pegar o cumprimento de uma circunferência, ou seja, todo a margem de um círculo (roda de um carro, por exemplo), e dividir pelo seu diâmetro (o comprimento dessa suposta roda passando pelo seu centro). Pronto. De uma maneira simplista chegamos até o Pi.

Também ontem aconteceu algo curioso, só que muito trágico e triste. No Rio de Janeiro, a vereadora (que no português, na flexão de gênero, temos o gênero feminino) negra (que na sociedade significa ascensão, representatividade e quebra de paradigmas quando se atinge um posto predominado pela cor branca, diferentemente da sociedade brasileira tão diversa como um todo) do PSOL (que na política é um partido socialista, ou seja, de esquerda, que como qualquer outro tem apoiadores e opositores mas que, a grosso modo, levanta bandeiras e pastas voltadas para o social) Marielle Franco (que em sua particularidade tenho quase certeza, a ponto de apostar um dedo, que ela tinha amores, sonhos, ideais, amigos, família, trabalho, enfim, era uma pessoa normal tipo eu e você) foi brutalmente assassinada.

Diferentemente do dia do Pi, se você não for um extraterrestre e tiver acesso a internet, TV, jornal, rádio ou qualquer tipo meio de comunicação, já deve saber a essa altura do campeonato quem é Marielle Franco. E talvez esqueça daqui um tempo quando um horror midiático maior chame sua atenção.

Mas, neste caso, não é apenas um horror midiático. É um fato que já nessa manhã se mostrou histórico. A história, mesmo que você não tenha gostado de estudar na escola assim como eu não gostava muito de estudar o Pi, nos deixa ensinamentos muito importantes que nos ajudam a ler o mundo de hoje e para projetor o futuro de amanhã.

E a história na natureza humana, assim como o Pi na natureza como um todo, se repete na vida de maneira cíclica.

Vamos abrir nossos olhos redondos e refletir com eles bem abertos. Círculo, na prática, não tem direita, nem esquerda, principalmente se você está na margem, assim como Marielle Franco esteve por muito tempo. E ironicamente seu fim trágico se deu quando tentou chegar ao centro do poder e que, convenhamos, é o centro dos problemas da nossa sociedade. Na prática, perdemos muito tempo quando achamos que estamos escolhendo uma direção quando estamos na verdade voltando para o mesmo lugar, dando voltas em nós mesmos. Na prática, Marielle morreu através do raio que veio do centro da nossa podridão.

Se você procurar nos livros de história ou no Google, você vai encontrar tantas outras Marielles desde muito antes do tempo do guaraná de rolha. A história se repete e você nem vai precisar do Pi para calcular ou para entender o que está acontecendo hoje.

Se você for humano, você vai entender e sentir essa dor. E se você não sentir indignação e compaixão, provavelmente, você é o extraterrestre que só lê isso tudo como mais um horror midiático.

Marielle morreu no dia do Pi. Marielle não voltará mais. Marielle está presente.

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